A liberdade é um direito fundamental consagrado na Constituição Federal, mas, em situações de prisão em flagrante, ela pode ser temporariamente restringida até que as circunstâncias sejam analisadas pelo juiz. Neste primeiro artigo da série sobre os mecanismos para pleitear a liberdade ao longo do processo penal, abordaremos a liberdade provisória como medida a ser requerida na audiência de custódia, um momento crucial para a defesa técnica e a garantia de direitos.
Nos próximos artigos, exploraremos a revogação da prisão preventiva e o habeas corpus, demonstrando como os pedidos se sofisticam conforme o processo avança. Aqui, o foco é na atuação imediata da defesa para evitar que o flagrante evolua para uma prisão preventiva desnecessária.
O Papel da Audiência de Custódia
Instituída pela Resolução 213/2015 do CNJ, a audiência de custódia é o primeiro momento em que o preso é apresentado ao juiz após a prisão em flagrante. Essa audiência tem como principais objetivos:
- Verificar a legalidade da prisão: Avaliar se os requisitos legais do flagrante foram cumpridos.
- Identificar abusos ou maus-tratos: Analisar se o preso sofreu violência física ou psicológica no momento da prisão.
- Decidir sobre a situação do preso: Optar pela conversão do flagrante em prisão preventiva, pela aplicação de medidas cautelares ou pela concessão da liberdade provisória.
É durante a audiência de custódia que o advogado tem a oportunidade de pleitear a liberdade provisória, evitando que o acusado permaneça encarcerado sem necessidade.
Liberdade Provisória e a Diferença com a Revogação da Prisão Preventiva
A liberdade provisória é concedida em uma fase inicial, geralmente na audiência de custódia, para evitar a conversão do flagrante em prisão preventiva. Já a revogação da prisão preventiva ocorre posteriormente, quando o juiz já decretou a medida e há mudanças no contexto ou elementos que justifiquem sua reavaliação.
Enquanto a liberdade provisória atua como um remédio imediato, a revogação da preventiva é uma tentativa de corrigir ou reverter uma decisão tomada em um momento posterior. Essa distinção é fundamental para entender as estratégias defensivas em cada etapa.
Fundamentos para o Pedido de Liberdade Provisória
O Código de Processo Penal, no artigo 312, exige que a prisão preventiva tenha fundamentos concretos, como:
- Garantir a ordem pública;
- Evitar interferência na instrução criminal;
- Assegurar a aplicação da lei penal.
Na audiência de custódia, cabe à defesa demonstrar a ausência dessas condições. Argumentos comuns incluem:
- Ausência de fumus comissi delicti: Falta de indícios suficientes de autoria e materialidade.
- Inexistência de periculum libertatis: O acusado não representa risco à sociedade, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal.
- Condições pessoais favoráveis: Primariedade, residência fixa e ocupação lícita.
Além disso, é possível sugerir a aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão, previstas no artigo 319 do CPP, como comparecimento periódico em juízo, monitoramento eletrônico ou proibição de ausentar-se da comarca.
Como Construir um Pedido de Liberdade Sólido
1. Documentação Essencial
Antes da audiência, o advogado deve reunir documentos que fortaleçam a defesa, como:
- Comprovante de residência fixa;
- Carteira de trabalho ou declaração de vínculo empregatício;
- Certidão negativa de antecedentes criminais.
2. Estratégia de Defesa
Na audiência, o advogado deve:
- Apresentar os fatos de forma clara e objetiva;
- Reforçar que a prisão em flagrante é desnecessária e desproporcional;
- Sugerir medidas cautelares como alternativa à prisão.
Por exemplo:
“Excelência, considerando que o acusado é primário, possui residência fixa e emprego regular, a prisão preventiva não é necessária. Medidas cautelares, como o comparecimento periódico em juízo, são suficientes para assegurar o andamento processual.”
Jurisprudência e Casos Relevantes
Os tribunais superiores têm reforçado a excepcionalidade da prisão preventiva e o direito à liberdade provisória. Um exemplo relevante é o HC 146.641/SP (STF), que afirma:
“A prisão preventiva deve ser medida excepcional, cabendo sua substituição por medidas cautelares sempre que a liberdade do acusado não representar risco concreto à ordem pública ou ao processo.”
Outro exemplo é o caso de prisões em flagrante por crimes de menor gravidade, onde a concessão de liberdade provisória se torna quase obrigatória na ausência de violência ou grave ameaça.
Conexão com os Próximos Artigos
Caso a liberdade provisória seja negada na audiência de custódia, a defesa pode adotar outras estratégias ao longo do processo penal. O próximo artigo da série tratará do pedido de revogação da prisão preventiva, explicando como construir argumentos sólidos para essa fase. Já o terceiro artigo abordará o habeas corpus, um recurso importante em instâncias superiores.
Conclusão
A audiência de custódia é um momento decisivo para pleitear a liberdade do acusado e garantir o respeito aos direitos fundamentais. A concessão da liberdade provisória, quando bem fundamentada, evita a privação desnecessária de liberdade e assegura o equilíbrio entre a persecução penal e os direitos constitucionais.
Com uma defesa técnica sólida e estratégias adaptadas a cada etapa do processo penal, é possível proteger os interesses do acusado e fortalecer a confiança no sistema de justiça.